‘PL dos Supersalários’ aumenta privilégios, alerta cientista político

JORNAL O IMPACTO
O cientista político Eduardo Araújo Couto, de 29 anos, residente em Mogi Mirim há pouco mais de dois anos, tem dedicado seu tempo a um dos assuntos mais controvertidos nas altas esferas de poder na atualidade: os supersalários que extrapolam o teto constitucional de R$ 46.366,19. Eduardo é gerente da área de Conhecimento do Movimento Pessoas à Frente, organização da sociedade civil, plural e suprapartidária, que elabora coletivamente diretrizes para uma gestão mais efetiva do Estado brasileiro. Ele ingressou na ONG depois de passar em concurso.
Mais recentemente, a organização tem se concentrado em alertar e mobilizar a sociedade para os riscos embutidos na aprovação do Projeto de Lei 2.721/2021 pela Câmara dos Deputados, em Brasília. Conforme assinalou Couto, o projeto, que ficou conhecido como “PL dos Supersalários”, voltará ao Senado, podendo receber modificações. Depois de nova aprovação, irá para a sanção presidencial do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O ponto fulcral da questão, diz Eduardo Couto, é o fato do PL ter sido concebido originalmente para coibir abusos remuneratórios do serviço público e, após uma tramitação repleta de obstáculos, os deputados aprovarem um texto que caminha em direção contrária àquilo que se propôs no início, ou seja, legalizando o avanço de setores específicos do funcionalismo (especialmente do Judiciário e do Ministério Público) sobre o teto constitucional.
Segundo Couto, no entendimento da organização para a qual atua e de diversas instituições da sociedade civil alinhadas com a causa, a proposta tende não só a perpetuar, mas também a ampliar privilégios e desigualdades, comprometendo a boa gestão dos recursos públicos, pois, se aprovada, legitima o pagamento de benefícios extras a título de indenização (os popularmente chamados de “penduricalhos”).

A marcação cerrada do Movimento Pessoas à Frente e demais apoiadores tem a finalidade, segundo Couto, de lançar luz nessa discussão e trazer a opinião pública a refletir sobre o assunto. O movimento afirma que a maioria da população brasileira (93%) é contra os supersalários. Eduardo Couto entende que se trata de uma causa que vai mobilizar a sociedade brasileira de uma forma ainda mais contundente.
Afirma ainda que o embasamento do assunto em critérios técnicos e objetivos ajuda a entender melhor e a desestigmatizá-lo. O estudo conduzido demonstra, por exemplo, que uma fração muito pequena dos servidores (0,3%) é aquela que tem ganhos questionáveis e que a maior parte dos servidores recebe remuneração próxima a R$3,3 mil.
O chamado pagamento extrateto custou aos cofres públicos algo em torno de R$ 11,1 bilhões em 2023. E a expectativa é de que o novo texto já aprovado pela Câmara deve aumentar os gastos com as remunerações acima do teto em R$ 3,4 bilhões, em vez de reduzir.
Fazendo comparação, o Movimento Pessoas à Frente diz, em documento obtido por O IMPACTO, que o valor extrateto pago aos servidores poderia resultar na construção de 4.582 Unidades Básicas de Saúde; atendimento anual de 1,36 milhão de famílias no Programa Bolsa Família, e de 3,9 milhões de alunos do ensino médio no Programa Pé-de-meia, sendo que este último possui orçamento próximo ao valor gasto com os adicionais, de R$13 bilhões.
Ainda segundo o documento, as causas das distorções que permitiram que se chegasse ao atual estágio de desequilíbrio guardam relação com interpretação do que vem a ser verbas remuneratórias e verbas indenizatórias.
A definição de verba remuneratória se refere àquela recebida mensalmente pelo empregado como contraprestação pelo serviço prestado, enquanto a indenizatória é recebida pelo funcionário com o objetivo de reparar despesas ou danos incorridos pelo trabalhador para viabilizar o exercício de seu trabalho.
“Para que as verbas possam ser materialmente classificadas como indenizatórias e assim configurar uma exceção autêntica ao teto constitucional, elas devem atender a quatro critérios básicos: devem ter natureza reparatória – ressarcir o servidor de despesas incorridas no exercício da função pública; devem ter caráter eventual – isto é, não podem ser concedidas a todos os servidores de forma indistinta, mas apenas como reparação de despesas específicas; devem ser transitórias – não podem ser verbas que passem a ser incorporadas em bases mensais, sem um horizonte temporal limitado; e devem ser expressamente criadas em lei, em sentido formal, não podendo ser instituídas por ato administrativo”, defende o estudo encomendado pelo Movimento Pessoas à Frente.
A reportagem de O IMPACTO questionou Eduardo Couto se o movimento dispõe de estudo comparando a remuneração dos servidores brasileiros que ganham acima do teto com similares em outros países. Ele informou que a necessidade desse tipo de estudo já apareceu no radar da instituição, mas que ainda não foi efetivada, cravando que será uma medida a ser encaminhada futuramente.